E tomando o pão, e havendo dado graças, partiu-o e deu-Iho, dizendo: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; (...) depois da ceia, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o novo pacto em meu sangue, que é derramado por vós.
Lucas 22.19,20)
Composta por inspiração divina, a Bíblia contém 66 li¬vros, escritos num período de mais de mil anos por mais de quarenta autores; no entanto, é perfeitamente harmónica. Ela encerra os mais belos episódios, determinados, sem par, não só pelos seus ensinamentos sem mácula, superiores a qualquer crí¬tica, mas também pelos detalhes: o mais belo sermão, o Sermão do Monte — Mateus, capítulo 5; o mais belo discurso, o de Pau¬lo diante do Rei Agripa — Atos, capítulo 26; a mais comovente exaltação ao amor — ICoríntios, capítulo 13; a mais inspirada poesia sacra, o Salmo 23 (Salmo 22 da Bíblia Católica); a mais bela oração, Salmo 19.13,14; o maior presente do céu para a huma-nidade: "Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3.16); a maior declaração de amor à criatura humana: "Pode uma mulher esquecer-se de seu filho de peito, de maneira que se não compadeça do filho do seu ventre? Mas ainda que esta se esquecesse, eu, todavia, não me esquecerei de ti" (Is 49.15); as mais belas decisões: "Aquele dentre vós que está sem pecado seja o primeiro que lhe atire uma pedra" (Jo 8.7); "Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus" (Mt 22.21); a mais sensacional promessa de esperança: "Não vos deixarei órfãos; voltarei a vós" (Jo 14.18); e tantas outras passa¬gens que nos encantam.
Contudo, os homens a quem Deus incumbe de assimilar seus ensinamentos, muitas vezes insistem em interpretar as coisas a seu modo, tornando-se legisladores, modificando a Palavra de Deus, investindo-se de uma autoridade que se não lhes dá, ignorando principalmente os ensinamentos daquele que dizem ser o "chefe" da Igreja, o apóstolo Pedro: "sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por vontade dos homens, mas os homens da parte de Deus falaram movidos pelo Espírito Santo" (2Pe 1.20,21).
Ninguém pode obrigar ninguém a aceitar a própria interpre¬tação da Bíblia. Só o Espírito Santo pode convencer (Jo 16.8). Mas o Concílio de Trento foi peremptório na sua tese: cabe à "santa madre igreja" julgar o verdadeiro sentido e a verdadeira interpre-tação das Sagradas Escrituras.
Jesus nos deixou duas ordenanças e nenhum sacramen¬to. A primeira ordenança é o batismo — o batismo de quem já tem discernimento e pode professar em público a sua fé: "Quem crer e for batizado (...)" (Mc 16.16); primeiro, crer, depois, ser batizado. A segunda ordenança é a Ceia do Senhor. A Ceia é ministrada àquele que for batizado. Eis o mecanismo: uma pessoa se converte e voluntariamente pede o batismo. Com o batismo, torna-se membro da igreja, e só o membro da igre¬ja em plena comunhão pode participar da Ceia, segundo en¬sina o Novo Testamento. No capítulo 22, versículos 7 a 20, Lucas explica como aconteceu a Ceia do Senhor, ministrada pelo próprio Senhor. Paulo também nos deixa explicações sobre como deveria acontecer. Está em ICoríntios 11.17-29. Ele es¬creveu à igreja que estava naquela cidade, admoestando, ensi¬nando e corrigindo erros na ministração. A prática até hoje serve de exemplo para os evangélicos e para alguns protestantes. Diz ele:
Nisto, porém, que vou dizer-vos não vos louvo; porquanto vos ajuntais, não para melhor, mas para pior. Porque, antes de tudo, ouço que quando vos ajuntais na igreja há entre vós dissensões; e em parte o creio (...)De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a ceia do Senhor; porque quando comeis, cada um toma antes de outrem a sua própria ceia; e assim um fica com fome e outro se embriaga. Não tendes porventura casas onde comer e beber? (...) Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou pão; e, havendo dado graças, o partiu e disse: Isto é o meu corpo que é por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o novo pacto no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim.
(ICo 11.17-25)
Reproduzindo as palavras de Jesus, Paulo confirmou que a Ceia é um memorial: "Fazei isto em memória de mim". Nenhum poder miraculoso existe no ato, a Ceia não é um sacramento. O sacramento é um sinal visível de uma graça invisível — signum visibile de gratia invisibile.
A Igreja Católica ensina que o verdadeiro corpo de Jesus — corpo, sangue, alma e divindade — está presente na hóstia e no vinho. Mas o ensinamento evangélico é o de que os elementos da Ceia, o pão e o vinho, são a figura, o símbolo, o motivo para a lembrança, um memorial, a recordação do sacrifício de Jesus. Não há transubstanciação, não há transformação da matéria, os elementos não mudam. O pão continua pão e o vinho continua vinho. Qualquer um pode fazer a experiência.
Esse dogma tem posto em prova, de uma maneira bem triste, os teólogos católicos, obrigando-os a formular os mais impertinen¬tes, esdrúxulos e inimagináveis argumentos. Há uma série de si¬tuações decorrentes da transubstanciação que se ensinam ao noviço (a transformação do pão em carne e a do vinho em sangue puro de Jesus). Algumas perguntas mencionadas pelo autor de Roma, sem¬pre a mesma40 são verdadeiros absurdos:
1. Se um rato chegar a comer a hóstia?
Resposta: O padre queimará o rato e lançará na pia ou em água corrente as cinzas do animal.
2. Se um comungante vomitar a hóstia?
Resposta: Praticará um ato meritório o assistente que tomar aquele vómito; mas se ninguém quiser absorver o vómito, este deverá ser queimado, e as cinzas, lançadas na piscina.
3. Se o sangue no cálice se congelar?
4. Um padre em pecado mortal pode operar a transubstan¬ciação?
Como se vê, esse dogma cria situações absurdas, mistério proposto acima de nossa imaginação e insultuoso ao Senhor Jesus Cristo; é menosprezo à capacidade humana de raciocinio sensato.
Em 1899, na cidade de Leopoldina, MG, um padre italiano chamado Cetrango foi processado por ter envenenado um colega seu, lançando estricnina no vinho da missa.41 Como o sangue santíssimo de Jesus pode embriagar, causar vómitos, envenenar?
De acordo com as passagens bíblicas mencionadas^ o crente na igreja primitiva recebia o pão e o vinha A primeira Ceia (a última Ceia mencionada na Bíblia) foi ministrada pelo próprio Senhor: "E tomando pão, e havendo dado graças, partiu-o e deu--lho, dizendo: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente, depois da ceia, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o novo pacto em meu sangue, que é derramado por vós" (Lc 22.19,20). E mais:
Forque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e havendo dado graças, o partiu e disse: Isto é o meu corpo que é por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhante¬mente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o novo pacto no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim.
(ICo 11.23-29)
Por que o catolicismo nega o vinho ao participante da Ceia? Responda quem o souber!
Muitos frades tentaram modificar os erros da Igreja e não conseguiram. O primeiro que obteve sucesso sem ser queimado vivo na fogueira sempre acesa da Inquisição foi Martinho Lutero.
Vitoriosa a Reforma, o catolicismo contra-ataca com o Concílio de Trento, uma espécie de remendo maior nos farrapos do "cristianismo", introduzido por incrédulos. Como justificar os sacramentos, a mariolatria, a sucessão apostólica (mais tarde a infa-libilidade do papa), o primado de Roma, o limbo, o purgatório, a Inquisição, a confissão auricular, o celibato, a missa, a ceia trun¬cada, a oração pelos mortos (que, parece, figura num dos livros apócrifos — e estes também não são aceitos pelos judeus, e jamais foram mencionados por Jesus ou pelos apóstolos), o culto aos san¬tos, a abstinência de alimentos, as indulgências e tantas outras aberrações? Nada disso é bíblico. Ao contrário. A Bíblia é taxativa na condenação de todas essas doutrinas. Dissemos todas essas doutrinas. "Mas o Espírito expressamente diz que em tempos poste¬riores alguns apostatarão da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrinas de demónios, pela hipocrisia de homens que falam mentiras e têm a sua própria consciência cauterizada, proibindo o casamento, e ordenando a abstinência de alimentos (...)" (lTm 4.1-3). São muito graves estas palavras: doutrinas de de¬mónios! Coincidência? Celibato e abstinência de alimentos!
O boníssimo João XXIII (o segundo de mesmo nome e número, já que o primeiro reinou juntamente com mais dois papas e teve 300 concubinas, e dele diziam que era o "diabo em carne e osso")42, que chefiou a Igreja Católica de 1958 a 1963, mani¬festou o desejo de saber se a Bíblia "proibia" ao papa fazer refeições em conjunto com outros prelados, e começou a lê-la a fim de saber se havia de fato alguma proibição. Demonstrou com isso o mais completo desconhecimento anterior dos Textos Sagrados. Com certeza, nunca lera antes uma Bíblia. Porém, nada existe sobre esse assunto.
A Contra-Reforma (Concílio de Trento), movimento de oposição ao protestantismo que durou de 1545 a 1563, procurou legitimar as "tradições". Ora, as tradições começaram a invadir a Igreja no dia em que ela se desviou das Escrituras. Roma, então, procurou incutir na mente do povo que as tradições procediam da mesma fonte que a Bíblia, e que deveriam ser recebidas com fé, acusando de insuficiência a Palavra de Deus. Cada desvio ou tentativa de justificar os erros é uma demonstração de menosprezo para com ela. Não tinham lido, por exemplo: "Jesus, na verdade, operou na presença de seus discípulos ainda muitos outros sinais que não estão escritos neste livro; estes, porém, estão escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, para que, crendo, tenhais vida em seu nome" (Jo 20.30,31). Ou: "Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça" (2Tm 3.16).
Mas a Contra-Reforma continuou a sua marcha. Era preciso criar obstáculos aos opositores. Era preciso mascarar os erros, criar embaraços, sofismar. Pareceu oportuno atribuir às Escrituras a culpa dos desvios, alegando com a própria Escritura: "Ainda tenho muito que vos dizer; mas vós não o podeis suportar agora" (Jo 16.12). O Concílio aproveitou a "deixa" e quis "matar dois coelhos com uma só cajadada": justificar seus erros e menosprezar os ensi¬namentos de Jesus. Não se proibiu a tradução da Bíblia nessa ocasião, mas oficializou-se a inclusão dos livros apócrifos, plenos de valor histórico, mas não inspirados, e por essa razão não aceitos pelos judeus, protestantes e evangélicos. Mas, em 1559, já se encon¬trava a seguinte cláusula junto à menção de várias edições, no índex dos livros proibidos, promulgada pelo Papa Paulo IV, rati¬ficada por Paulo V cinquenta anos mais tarde: "Não se pode ler, imprimir ou possuir sem licença do Santo Ofício as edições da Bíblia em língua vulgar".43 Qual o motivo dessa proibição?
"Descarregando" sobre a tradição toda espécie de erros até então existentes, a Igreja Católica ficou tranquila consigo mesma, já pensando nos erros futuros que iria continuar introduzindo, como a infalibilidade do papa e a ascensão de Maria. A infalibi-lidade causou estupefação nos próprios arraiais. Como seria de esperar, houve inúmeros desentendimentos com os papas, desa¬venças e coisas muito mais sérias, sobre as quais discorreremos no capítulo 17. Casos gravíssimos, de grande perplexidade, de que não se tem notícia em outras fontes, a não ser o de Pedro I de
Portugal, que desenterrou Inês e fê-la sentar no trono, à semelhança do que ocorreu com o Papa Formoso.44.45
Todas as heresias que vão sendo incluídas na Igreja são impu¬tadas à Tradição, ou Patrística, ou Patrologia, na esperança de que a Tradição possa enganar muita gente por muito tempo. É mais uma prova do desconhecimento do Novo Testamento. Jesus, Onipo-tente, Onisciente, Onipresente, já a havia condenado aberta e claramente em disputa com alguns judeus do seu tempo:
Então chegaram a Jesus uns fariseus e escribas vindos de Jerusalém e lhe perguntaram: For que transgridem os teus discípulos a tradição dos anciãos? (...) ele, porém, respondendo, disse-lhes: E vós, por que transgredis o mandamento de Deus por causa da vossa tradição? (...)E assim por causa da vossa tradição invalidastes a palavra de Deus (...) Mas em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens.
(Mt 15.1-3,6,9)
Precisamos analisar os fatos sem paixão. A paixão cega o entendimento e não conduz ninguém à salvação. Só Jesus Cristo pode nos salvar, e ele diz: "Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando" (Jo 15.14). Como podemos receber a sua graça sendo seus inimigos? Haveremos de ser amigos ou inimigos de nos¬so Salvador? Ser amigo de Jesus, conforme ele mesmo diz, é fazer o que ele manda!
